28 de jul. de 2020

Epístolas Gerais

Epístolas Gerais

 Joenildo Fonseca Leite

São assim chamadas, porque, diferentes das de Paulo, não são endereçadas a nenhuma igreja em particular, mas aos crentes em geral. Duas delas (2ª e 3ª de João) foram escritas a indivíduos em particular.

 

Epístola aos Hebreus

 

Ao contrário das primeiras nove Epístolas (de Romanos a 2 Tessalonicenses), todas dirigidas a igrejas cristãs, nenhuma dessas últimas nove é endereçada desse modo. A primeira a dirige-se claramente aos hebreus, como declaram as palavras de abertura (i.e., “pais” e “nos”). A epístola de Tiago é enviada às “doze tribos que se encontram na Dispersão” (1.1). As duas epístolas de Pedro são para “os forasteiros da Dispersão” (1Pe 1.1; 2Pe 3.1). Nem todas as cartas dirigem-se tão especificamente aos leitores judeus, mas elas contêm indicações incidentais aos seus destinatários judeus.

Ao contrário das epístolas às igrejas cristãs, que nos abrem o esplêndido “mistério” da Igreja como o “corpo” místico, a “noiva” e o “templo” de Cristo, essas epístolas aos cristãos hebreus não contém qualquer ensino nesse sentido. Não existe nada aqui sobre o fato de os membros terem morrido e ressuscitado com Cristo: nada de assentarem-se juntos “nas regiões celestiais em Cristo”.

Se tivermos de captar o significado essencial desta epístola aos Hebreus, devemos apreciar devidamente seu ponto de vista. Ele corresponde ao de Levítico em relação a Êxodo. Todas as ofertas de cheiro suave ou não exigidas e especificadas em Levítico, tipificam aspectos do sacrifício do Senhor na cruz, mas são todos aspectos dos benefícios que ela provê para os que já foram remidos e estão em relação de aliança com Deus.

Esta Epístola aos Hebreus se interessa pelo aspecto final e definitivo do sacrifício pascal do Senhor e do derramamento do sangue da aliança. Ela se dirige aos que creram nele e fazem parte da aliança, sendo seu propósito mostrar-lhes como nosso maravilhoso Jesus cumpre completamente o sacerdócio e sacrifícios Levítico. Devemos manter este ponto de vista sempre em mente, ao estudarmos a carta aos hebreus.

A Epístola aos Hebreus foi escrita, como o nome indica, particularmente aos judeus crentes, embora tenha valor permanente e aplicação contínua para todos os crentes de todas as épocas. A leitura da epístola revelará que a maior parte dos hebreus cristãos, a quem o autor se dirige, estava em perigo de afastar-se da fé. Comparado com a nação inteira, era um pequeno grupo de pouca importância, considerado pelos seus patrícios como traidores e objetos de suspeita e ódio. Sentiam a sua isolação, separados do resto da nação. Uma grande perseguição os ameaçava. Oprimidos pelas tribulações presentes e pelo pensamento de adversidades futuras, cederam ao desânimo. Eles ficavam atrás no progresso espiritual (5.11-14); muitos negligenciavam o culto (10.24,25); muitos, cansados de andar pela fé, olhavam para o magnífico templo de Jerusalém, com os seus sacrifícios e ritos imponentes. Havia a tentação de abandonar o Cristianismo e voltar ao Judaísmo. Para impedir tal apostasia, foi escrita esta epístola, cujo propósito principal é mostrar a relação do sistema de Moisés com o Cristianismo, e o caráter simbólico e transitório do primeiro. O escritor, antes de tudo, expõe a superioridade de Jesus Cristo, acima todos os mediadores do Antigo Testamento e mostra a superioridade da Nova Aliança sobre a Antiga, como a superioridade da substância sobre a sombra, do antítipo sobre o tipo e da realidade sobre o símbolo. Estes crentes encontravam-se perplexos e desanimados pelas múltiplas tentações e pelo fato de terem de andar pela fé no meio de adversidades, pela mera Palavra de Deus, sem nenhum apoio e consolo visíveis. O autor da epístola prova-lhes que os heróis do Antigo Testamento passaram por experiências semelhantes, andando pela fé, confiando na palavra de Deus, apesar de todas as circunstâncias adversas e até enfrentando a morte (cap. 11). Assim, os crentes, como os seus antepassados, hão de sofrer como vendo aquele que é invisível. O tema pode resumir-se da seguinte maneira: a religião de Jesus Cristo é superior ao Judaísmo, porque tem um pacto melhor, um sumo sacerdote melhor, um sacrifício e um tabernáculo melhores.

Muitos judeus cristãos, tendo saído do Judaísmo para o Cristianismo, querem voltar atrás para escapar da perseguição feita por seus conterrâneos. O escritor de Hebreus exorta-os a deixarem-se “levar para o que é perfeito” (Hb 6.1). Seu apelo é baseado na superioridade de Cristo sobre o sistema judaico. Cristo é melhor do que os anjos, pois eles o adoram. Ele é melhor do que Moisés porque ele o criou. Ele é melhor do que o sacerdócio de Arão, porque seu sacrifício valeu de uma vez por todas. Ele é melhor do que a Lei, porque ele é o mediador de uma aliança melhor. Em resumo, há mais a ser ganho em Cristo do que perder no Judaísmo. Insistir em Cristo produz uma fé testada, autodisciplina e um amor visível em boas obras.

Embora versões consagradas como a King James Version (Versão do Rei Tiago) usem o título “A Epístola de Paulo, o Apóstolo, aos Hebreus”, não há evidência de manuscritos primitivos que o apóiem. O título mais confiável e antigo é simplesmente Pros Ebraious, “Aos Hebreus”.

 

O Autor de Hebreus:

Não há outro livro do Novo Testamento cuja autoria seja mais disputada, nem cuja inspiração seja mais incontestável. O próprio livro é anônimo. Por causa da diferença de estilo, comparado com os outros escritos de Paulo, muitos eruditos ortodoxos negam que foi ele quem o escreveu. Tertuliano, no terceiro século, declarou que Barnabé foi o autor. Lutero sugeriu que fosse Apolo.

Assim como os ancestrais de Melquisedeque, também a origem de Hebreus é desconhecida. Incerteza cerca não apenas sua autoria, mas também o local em que foi escrita, sua data e seu público. A questão de sua autoria atrasou seu reconhecimento no Ocidente como parte do Cânon do Novo Testamento, apesar do apoio de Clemente de Roma. Hebreus não foi aceita unanimemente como autoritativa na Igreja Ocidental até o século IV, quando os testemunhos de Jerônimo e Agostinho resolveram a questão. Na Igreja Oriental, não houve problema de aceitação canônica, porque Hebreus era considerada como uma da “14” epístolas de Paulo. Esta questão sobre a canonicidade Hebreus foi outra vez levantada durante a Reforma, mas, apesar de sua anonimidade, a profundidade espiritual e a qualidade de Hebreus deram crédito à sua inspiração.

Hb. 13.18-24 nos diz que este livro não era anônimo para os seus leitores originais; eles, evidentemente, conheciam o autor. Por alguma razão, entretanto, a tradição da Igreja primitiva se dividiu quanto à identidade do autor. Parte da Igreja atribuiu a autoria a Paulo; outros preferiram Barnabé, Lucas ou Clemente; e alguns optaram por considerá-la anônima. Assim, a evidência externa não ajuda na determinação do autor.

A evidência interna deve ser apelação de última instância, mas aqui também os resultados são ambíguos.

 

O Tempo de Hebreus

Por causa do uso exclusivo da Septuaginta (tradução grega do Antigo Testamento hebraico) e o elegante estilo grego encontrado em Hebreus, alguns estudiosos recentes argumentam que este livro foi escrito para leitores gentios. Entretanto, o volume das evidências favorece o ponto de vista tradicional que os destinatários originais desta Epístola eram cristãos judeus. Além do título antigo “Aos Hebreus”, há também o uso frequente do Antigo Testamento como uma autoridade inquestionável, como conhecimento do ritual sacrificial e com muitos contrastes entre o Cristianismo e o Judaísmo, tendo como objetivo evitar que os leitores se desviem para o Judaísmo.

Muitos lugares foram sugeridos para a localização dos leitores, mas o destino desta Epístola não pode ser determinado com certeza. No passado, Jerusalém era frequentemente sugerida, mas este ponto de vista é descartado por quatro problemas:

É improvável que um livro dirigido aos palestinos citasse exclusivamente a Septuaginta, ao invés do Antigo Testamento Hebraico.

Os crentes palestinos eram pobres (Rm 15.26), mas estes leitores tinham condições de ajudar financeiramente outros cristãos. (6.10).

Os residentes em Jerusalém não seriam caracterizados pela descrição feita em 2.3, porque alguns teriam sido testemunhas oculares do ministério de Cristo.

“Ainda não tendes resistido até o sangue” (12.4) não se encaixa na situação de Jerusalém. O ponto de vista da maioria atualmente é que os destinatários de Hebreus, provavelmente, vivessem em Roma. A afirmação “Os da Itália vos saúdam” feita em 13.24 parece sugerir que italianos de fora da Itália estão mandando saudações para casa.

Os destinatários desta Epístola eram crentes (3.1) que chegaram à fé através de testemunhas oculares de Cristo (2.3). Não eram principiantes (5.12) e permaneceram firmes durante as dificuldades por causa de sua postura perante o evangelho (10.32-34). Infelizmente, eles se tornaram “tardios em ouvir” (5.11) e corria o perigo de se afastarem (2.1; 3.12). Isso fez com que ficassem suscetíveis à perseguição renovada que vinha sobre eles (12.4-12), e o autor achou necessário o precaver usando uma “palavra de exortação” (13.22). Mesmo havendo discordância em relação ao perigo específico envolvido, a posição clássica de que os leitores estavam à beira de cair no Judaísmo para evitarem a perseguição dirigida aos cristãos parece ser apoiada pelo curso geral do livro. A repetida ênfase de Hebreus na superioridade do Cristianismo em relação ao Judaísmo não faria sentido se os leitores estivessem a ponto de voltarem para o Gnosticismo ou paganismo.

O lugar onde foi escrita é desconhecido, mas há uma estimativa da data em que foi escrita. Hebreus foi citada por Clemente de Roma em 95 d.C., mas, por não mencionar o fim do sistema sacrificial do Antigo Testamento com a destruição de Jerusalém em 70 d.C., indica que foi escrita antes dessa data. Timóteo ainda estava vivo (13.23), a perseguição aumentava, e o sistema judaico estava prestes a ser removido (12.26-27). Tudo isso sugere uma data entre 64 e 68 d.C.

Ela foi escrita, (13.24), para reprimir a apostasia dos judeus cristãos que tinham a intenção de voltar ao Judaísmo. Seu conteúdo é assim expresso: a) A superioridade de Jesus aos mediadores e líderes do Antigo Testamento (1.1-8.6). b) A superioridade da Nova Aliança à Antiga (8.7-10.18). c) Exortações e admoestações (10.19-13.25).

I. A SUPERIORIDADE DE JESUS AOS MEDIADORES E LÍDERES DO ANTIGO TESTAMENTO:

Jesus é superior aos profetas (vv1-3).

Jesus é superior aos anjos (1.4-14).

Exortação em vista das declarações anteriores (2.1-4). Se a desobediência à palavra dos anjos trouxe castigo, qual não será a perda se a salvação anunciada pelo Senhor for negligenciada?

Jesus foi exaltado acima dos anjos. Por que foi feito menos do que eles? (2.5-18).

Jesus é maior do que Moisés (3.1-6), porque: a) Moisés foi apenas parte da casa de Deus; Jesus é o Fundador dela; b) Moisés foi apenas servo; Jesus é o Filho.

Exortação em vista destas declarações (3.1-6; 3.7-4.5). O crente é membro de uma casa espiritual presidida pelo Filho de Deus. Embora esses israelitas tivessem experimentado a salvação de Jeová junto ao Mar Vermelho, não entraram na Terra da Promissão. O pecado que o excluiu foi o de incredulidade – pecado, que, continuado, excluirá o crente judeu dos privilégios da sua herança.

Jesus é maior do que Josué (4.6-13).

O sumo sacerdócio de Jesus (4.14-5.10).

O autor interrompe o fio de seu pensamento a fim de proferir uma palavra de repreensão, exortação, admoestação e ânimo (5.11-14; 6.1-3, 6-8, 9-20).

O sacerdócio de Cristo (simbolizado pelo de Melquisedeque) é superior ao de Arão (7.1-8.6). Melquisedeque é mencionado, nesta conexão, como símbolo de Cristo. O autor usa um modo judaico de ilustração. Toma um fato espiritual como este e demonstra o seu valor típico. Melquisedeque é símbolo de Cristo nas seguintes maneiras: a) Devido ao significado do seu nome “Rei de Paz”; b) O seu sacerdócio não era hereditário. Exigia-se que os sacerdotes judaicos provassem a sua genealogia antes de serem admitidos ao ofício (Esdras 2.61-63). Embora sendo sacerdote, não há registro da genealogia de Melquisedeque e a isto se refere a expressão “sem pai, sem mãe” (v.3). Neste sentido, a falta de genealogia sacerdotal é símbolo (7.14); c) O fato de não haver registro de seu nascimento nem da sua morte é característico da natureza eterna do sacerdócio de Cristo. A isto se refere a expressão “não teve princípio de dias, nem fim de existência” (v.3).

O sacerdócio de Cristo, simbolizado por Melquisedeque, é superior ao de Arão, como provam os seguintes fatos: a) Levi, estando ainda, por assim dizer, nos lombos de Abraão, pagou os dízimos a Melquisedeque (7.4-10); b) A maturidade espiritual não era atingível pelo sacerdócio de Arão e pela aliança da qual era mediador. Isto é testificado pelo fato de ter surgido outra ordem de sacerdócio, a de Melquisedeque. Esta alteração de sacerdócio implica em uma alteração da Lei. A alteração foi efetuada por causa da incapacidade da Lei de Moisés em proporcionar maturidade espiritual (compare com Romanos 8.1-4); c) Contrário ao sacerdócio de Arão, o sacerdócio de Melquisedeque foi instituído com um juramento (v.20-22). Um juramento de Deus, acompanhando qualquer declaração, é prova de imutabilidade; d) O ministério dos sacerdotes da ordem de Arão terminava com a morte; mas Cristo tem um sacerdócio eterno e imutável, porque ele vive para sempre (vv.23-25); e) Os sacerdotes de Arão ofereciam sacrifícios todos os dias. Cristo ofereceu um sacrifício eternamente eficaz (7.26-28); f) Os sacerdotes de Arão serviam num tabernáculo que era somente o símbolo terrestre do tabernáculo em que Cristo ministra (8.1-5); g) Cristo é o mediador duma melhor aliança. (8.6)

 

II. A SUPERIORIDADE DA NOVA ALIANÇA À ANTIGA:

Esta superioridade manifesta-se das seguintes maneiras: 1. A Antiga Aliança foi somente provisória (8.7-13); 2. As ordenanças e o santuário da Antiga Aliança eram simplesmente tipos e sombras que não proporcionavam a união perfeita com Deus (9.1-10); 3. Mas Cristo, o verdadeiro sacerdote do santuário celestial – por um sacrifício perfeito – a sua própria Pessoa, proveu redenção eterna e perfeita comunhão com Deus (vv.11-15); 4. A Nova Aliança foi selada com melhor sangue do que o dos bezerros e dos bodes – o sangue de Jesus (vv.16-24); 5. O único sacrifício da Nova Aliança é melhor do que os muitos da Antiga (9.25-10.18).

 

III. EXORTAÇÕES E ADMOESTAÇÕES:

1. Exortação à fidelidade e constância em vista do fato de terem acesso seguro a Deus por meio de um fiel sumo sacerdote (10.19-25); 2. Admoestação contra a apostasia (vv.26-31); compare com 6.4-8). Sugere um erudito, que se pode deduzir do versículo 29 as seguintes condições à readmissão às sinagogas, de judeus apóstatas do Cristianismo: a) que negassem que Jesus fosse o filho de Deus; b) que declarassem que seu sangue fora justamente derramado como o de um malfeitor; c) que atribuíssem, como fizeram os fariseus, os dons do Espírito à operação de demônios. 3. Exortação à paciência em vista da recompensa prometida (vv.32-36); 4. Exortação a andar pela fé (10.37-12.1-4). Nesta seção o propósito do autor é demonstrar que nos séculos passados os amados por Deus foram os que andaram pela fé e que confiaram nele apesar de todas as circunstâncias difíceis. 5. Exortação à obediência escrupulosa por causa da vocação celestial (12.18-24), e por causa do Chefe celestial (vv.25-29). 6. Exortações finais (13.1-37) e conclusão (vv.18-25).

Esta epístola, por ser então escrita em primeiro lugar aos cristãos hebreus e especialmente aos que se sentia tentados a voltar ao judaísmo, tem por objeto expor, através de toda ela, a superioridade do evangelho sobre a aliança e o sistema associado a Moisés. Ela faz isto mostrando a perfeição e finalidade da nova aliança sem minimizar a antiga. Em lugar de diminuir o judaísmo, a nova aliança o transfigura e reverencia, acabando finalmente por cumpri-lo. Portanto, a palavra-chave aqui é “superior”, ocorrendo doze vezes; e além da palavra “superior”, a idéia repete-se em todo o livro. Na primeira parte da epístola, o Senhor Jesus é superior aos anjos (1-2); superior a Moisés (3); superior a Josué (4); superior a Arão (5-7). Na parte seguinte, temos a aliança “superior” (8.6), baseada nas promessas “superiores” (8.6), construindo um tabernáculo “superior” (9.11), purificado por um sacrifício “superior” (9.23). Na terceira parte, a fé focaliza um patrimônio “superior” no céu (10.34), e aspira uma pátria “superior” (11.16), e uma ressurreição “superior” (11.35), herdando coisa “superior” de Deus (11.40).

A segunda idéia é a da natureza definitiva de Cristo, da Cruz e da nova aliança. Um outro aspecto proeminente da epístola é o fato de achar-se repleta de advertências solenes. Observe o desafio repetido: “Portanto....”

A epístola é um tratado metódico e progressivo, mais regular na estrutura e retórico na forma do qualquer de seus predecessores. Acreditamos que sofreu muito nas mãos de escritores que desenvolveram análises perspicazes em lugar de perceber as verdadeiras dobradiças nas qual o argumento está preso, e as verdades centrais em cada uma de suas três partes principais. O texto de 10.19 marca claramente uma interrupção. Até esse ponto o tratado é quase inteiramente doutrinário, enquanto que, daí para frente, ele é quase inteiramente exortativo. Qualquer leitor cuidadoso irá notar também nos capítulos 1-7 a ênfase sobre a pessoa de Cristo; nos capítulos 8-10.18, ela se acha sobre a obra intercessória de Cristo, e a partir de 10.19 até o final da epístola, concentra-se na fé como a verdadeira resposta à pessoa de Cristo.

 

Epístola de Tiago

 

Para o estudo deste livro, orienta-se que leia duas vezes a epístola inteira, vendo depois se, numa terceira leitura, o aluno pode descobrir suas interrupções e partes.

 

O Livro de Tiago

A tradição fixa o martírio de Tiago no ano 62, mas esta epístola não mostra traços das revelações mais amplas relativas à Igreja e às doutrinas distintas da graça feitas através do apóstolo Paulo, nem mesmo das discussões referentes à relação entre os gentios convertidos e a lei de Moisés, que culminou no primeiro concílio (Atos 15), presidido por Tiago. Isto presume uma data bem primitiva para Tiago, que pode ser estabelecida, com toda confiança, como “a primeira epístola aos Cristãos”.

A expressão “doze tribos que se encontram na Dispersão” não deve ser vista como uma referência aos judeus, mas aos cristãos judeus da Dispersão. A Igreja começou com eles (At 2.5-11) e Tiago, que parece não ter deixado Jerusalém, sentiria uma responsabilidade pastoral peculiar por essas ovelhas dispersas. Eles ainda recorriam às sinagogas ou chamavam por esse nome suas próprias assembléias. Com base em Tiago 2.1-8, parece que eles continuavam a manter os tribunais na sinagoga para o julgamento das causas surgidas em seu meio. A epístola é, portanto, extremamente elementar. Supor que Tiago 2.14-26 é uma polêmica contra a doutrina da justificação de Paulo é um absurdo. Nem Gálatas nem Romanos tinha sido escritas ainda.

Quanta diferença entre a longa e retórica Epístola aos Hebreus e esta curta e destacada Epístola de Tiago! Como é intrigante o milagre sutil pelo qual a inspiração sobrenatural mescla-se com as diferentes mentalidades de nossos escritores do Novo Testamento, encobrindo, mas jamais suprimindo os traços da personalidade humana!

Quão interessante também é a ordem em que esses escritos aos cristãos hebreus ocorrem.

A fé sem obras não pode ser chamada de fé. A fé sem obras é morta, e a fé morta é pior do que nenhuma fé. A fé deve operar, ela deve produzir, ela deve ser visível. A fé verbal não é suficiente; a fé mental é insuficiente. A fé deve existir, mas deve ser muito mais. Ela deve inspirar ação. Nesta Epístola aos crentes judeus, Tiago integra a verdadeira fé e toda experiência prática diária, enfatizando que a fé verdadeira deve se manifestar em obras de fé.

A fé resiste às dificuldades. As dificuldades vêm e vão, mas a fé forte as enfrentará e desenvolverá a perseverança. A fé percebe as tentações. Ela não nos permitirá concordar com nossa luxúria e cair em pecado. A fé obedece à Palavra. Ela não irá simplesmente ouvir e não fazer. A fé produz praticante. A fé não tem preconceito. Para Tiago, a fé e o favoritismo não podem coexistir. A fé se revela em suas obras. A fé é mais do que simples palavras; é mais do que sabedoria; ela é demonstrada pela obediência e responde prontamente às promessas de Deus. A fé controla a língua. Esta pequena mas imensamente poderosa parte do corpo deve ser controlada. A fé pode fazer isso. A fé age sabiamente. Ela nos dá habilidade de decidir pela sabedoria que é celestial e evitar a sabedoria que é terrena. A fé produz separação entre o mundo e a submissão a Deus. Ela nos dá a habilidade de resistir ao diabo e humildemente nos aproximarmos de Deus. Finalmente, a fé espera pacientemente pela vinda do Senhor. Nos problemas e dificuldades, ela reprime a reclamação.

O nome Iakobos (Tiago) em 1.1 é a base para o antigo título Iakobou Epistole (Epístola de Tiago). Iakobos é a forma grega do nome hebraico Jacó, um nome judaico muito comum no primeiro século.

 

O autor de Tiago - A Pessoa de Tiago

O nome “Tiago” ocorre 40 vezes no Novo Testamento. Uma comparação reduz isso para (1) Tiago, “filho de Zebedeu” e irmão do apóstolo João; (2) Tiago, “filho de Alfeu”; (3) Tiago, o “irmão” do Senhor (Mt 13.55; Mc 6.3). O primeiro deles foi martirizado por Herodes (At. 12.2) cerca do ano 42 a.D., e não escreveu esta epístola. Achamos que não e demos nossas razões num breve apêndice ao estudo. O elemento prático é que o escritor de nossa epístola foi aquele Tiago que aparece em destaque no livro de Atos dos Apóstolos como uma espécie de presidente ou líder dos presbíteros e da assembléia cristã em Jerusalém.

Existe tanta correspondência entre o que vemos dele em Atos e o que ele escreve na epístola que uma coisa confirma a autenticidade da outra. Em Atos 12.17, lemos que na noite em que Pedro foi milagrosamente salvo da prisão de Herodes, ele deu estas instruções para o grupo em oração: “Anunciai isto a Tiago e aos irmãos” que é um primeiro indício da importância dele entre os líderes. Mais tarde, no capítulo 15, naquele primeiro e histórico concílio cristão, nós o encontramos ocupando claramente uma posição de liderança, fazendo um resumo (vv, 13-18), apresentando a sentença de um presidente (vv.19-21: ego krino, julgo eu), e seu conselho de caráter presidencial sendo levado a efeito (22-31). Mais tarde ainda, no capítulo 21, lemos que Paulo, ao chegar em Jerusalém depois de sua terceira viagem missionária, “foi... encontrar-se com Tiago, e todos os presbíteros se reuniram” (v.18), o que indica novamente uma primazia reconhecida.

Eusébio preserva uma descrição interessante de Tiago feita por Hegésipo, um escritor do início do segundo século. “Tiago, o irmão do Senhor, que, por haver muitos com o mesmo nome, recebeu o sobrenome de Justo por parte de todos, desde os dias do Senhor até agora e a quem foi dado o governo da Igreja com os apóstolos. Ele não bebia vinho nem bebida forte e abstinha-se de alimento de origem animal. Sua cabeça jamais foi tocada por navalha; nunca se ungiu com óleo e nunca se banhou. Não usava roupas de lã, mas apenas de linho fino. Tinha o hábito de entrar sozinho no templo, sendo quase sempre encontrado de joelhos, pedindo perdão pelo povo, de modo que seus joelhos tornaram-se duros como os de um camelo em conseqüência de suas súplicas habituais e de ajoelhar-se diante de Deus. De fato, por causa de sua grande justiça foi chamado Justo, também Oblias, que em grego é “defensor do povo”, como os profetas declaram com respeito a ele”.

Tiago foi martirizado. O historiador Josefo coloca o evento entre a morte do governador Festo (Atos 25) e a vinda de seu sucessor, Albino, que, pelo nosso calendário, ocorreu em 62 a.D. Ele conta o fato assim: “César, ao ouvir da morte de Festo, enviou Albino como procurador para a Judéia.... Ananias (o sumo sacerdote em Jerusalém) pensou que chegara então a sua oportunidade.... Reuniu, portanto o sinédrio de juízes e apresentou diante deles o irmão de Jesus, chamado Cristo, cujo nome era Tiago, e alguns outros. Depois de ter formado uma acusação contra eles como infratores da lei, enviou-os para serem apedrejados...” a variação melodramática de Hegésipo, afirmando que Tiago foi atirado do pináculo do templo pelos escribas e fariseus e depois espancado até morrer, parece artificial e improvável.

O argumento da epístola é que a verdadeira fé cristã deve expressar-se em bondade prática. Assim, em toda a carta, a ênfase é dada às boas obras. Esta ênfase é com certeza muito necessária. Não existe contradição entre Paulo, com sua ênfase principal na fé, e Tiago, com sua insistência sobre as boas obras. Tiago não defende as boas obras como um meio de salvação, mas com um produto desta. Portanto, argumentar (como alguns tentaram) que esta epístola é uma espécie de polêmica contra a doutrina da justificação pela fé apresentada por Paulo é completamente absurdo; pois mesmo que a epístola não seja o primeiro artigo do Novo Testamento, não pode haver praticamente dúvida de que nem Romanos nem Gálatas haviam sido escritos quando Tiago redigiu a sua carta. Podemos dizer que o tema desta epístola tem como base as provas da verdadeira fé.

Análise e Comentários.

A epístola de Tiago não se trata simplesmente de uma cadeia de pensamentos seguidos, mas existem áreas facilmente distinguíveis. O capítulo 1 trata decididamente da tentação e de outras considerações ligadas a ela. A primeira prova da verdadeira fé, diz Tiago, é suportar a tentação. O capítulo 2 é também dedicado à bondade imparcial como outra prova da realidade da fé. O capitulo 3 apresenta uma descrição vívida e severa sobre o controle da língua como outra prova da verdadeira fé cristã. Foi dito com propriedade que não existe um parágrafo mais “veemente e vibrante” no Novo Testamento. O restante da carta (4.1- 5.6) exorta-nos à santidade em todas as coisas – numa série de destaques rápidos sobre aspectos sucessivos. Não existe aqui necessidade de uma análise mais demorada.

A epístola de Tiago é o livro do Novo Testamento como Provérbios o são do Antigo. De fato, suas declarações francas e concisas de verdades morais têm semelhança notável com Provérbios. Ela contém muito poucas instruções doutrinárias; o seu propósito principal é por em relevo o aspecto religioso da verdade. Tiago escreveu a certa classe de judeus cristãos na qual se manifestava uma tendência de separar a fé das obras. Pretendiam ter a fé, mas existia entre eles impaciência sob provação, contendas, acepção de pessoas, difamações e mundanismo. Tiago explica que uma fé que não produz santidade de vida é coisa morta, um mero consentimento a uma doutrina, que não vai além do intelecto. Salienta a necessidade de uma fé viva e eficaz para obter a perfeição cristã, e refere-se ao simples Sermão da Montanha que exige verdadeiros atos de vida cristã.

Há aqueles que falam de santidade e são hipócritas; os que professam o amor perfeito, mas que não vivem em paz com os irmãos; aqueles que ostentam muita fraseologia religiosa, mas fracassam na filantropia prática. Esta epístola foi escrita para eles. Talvez não lhes dê muito consolo, mas deve ser-lhes muito útil. O misticismo que se contenta com sistemas e frases religiosas, mas negligencia o sacrifício real e o serviço devotado, encontrará aqui o seu antídoto. O antimonianismo que professa grande confiança na livre graça, mas que não reconhece a necessidade de uma vida pura correspondente, deve estudar a sabedoria prática da epístola. Os ‘quietistas’ que se contentam em sentar-se e cantar para conseguir a felicidade eterna, deve ler esta epístola até sentirem a sua inspiração a fim de apresentarem ativamente as boas obras; todos aqueles que são fortes na teoria e fracos na prática, devem mergulhar no espírito de Tiago; e como há gente desse gênero em cada comunidade em todas as épocas, a mensagem da epístola nunca envelhecerá.

Podemos resumir o tema da seguinte maneira: Cristianismo prático.

Esta epístola provavelmente foi escrita em Jerusalém, e seu conteúdo pode ser assim classificado:

A tentação como prova de fé (1.1-21). As obras como evidência da fé verdadeira (1.22-2.26). As palavras e seu poder (3.1-12). Verdadeira e falsa sabedoria (3.13-4.17). Paciência sob opressão: a paciência da fé (5.1-12). Oração (5.13-20).

 

I. A TENTAÇÃO COMO PROVA DA FÉ:

1. O propósito das tentações: aperfeiçoar o caráter cristão (vv.2-4). A palavra “tentação” é usada aqui num sentido mais amplo, incluindo perseguições externas e solicitações internas ao mal. Tiago ensina aos leitores como transformar a tentação em bênção, fazendo dela uma fonte de paciência e usando-a como o fogo que prova o ouro.

2. Uma qualidade que deve ser exercitada em suportar a tentação com êxito: a sabedoria. Esta sabedoria é dom de Deus, concedido somente sob a condição de uma fé firme (vv.5-8).

3. Uma fonte de prova e uma fonte de tentações: pobreza e riqueza (vv.9-11). O pobre não deve sentir tristeza por causa da sua pobreza; o rico não se deve orgulhar, tampouco, de sua riqueza. Ambos devem regozijar-se por sua vocação elevada.

4. A recompensa por suportar a prova e tentação: uma coroa de vida (v.12).

5. A fonte de tentação interna para o mal (vv.13-18). Embora Deus possa mandar aflições para experimentar os homens, não envia impulsos maus para tentá-los. Quando os homens dizem, como muitas vezes já disseram que ‘Deus criou os homens assim’; que ‘a carne é fraca’, ou que ‘por um momento Deus os desamparou’; que fizeram mal porque não podiam agir de outra maneira, ou que o homem não passa de um autômato, sendo os seus atos os resultados inevitáveis e, portanto, irresponsáveis, do meio ambiente – estão atribuindo a Deus a culpa dos seus atos... Tiago dá o verdadeiro sentido do mal. Este vem da concupiscência - o desejo - que é para a alma como meretriz tentadora que a tira do abrigo da inocência, a seduz e dá à luz o pecado cometido. Deus jamais envia impulsos maus; é ele quem nos dá o poder pelo qual somos elevados a uma nova e mais nobre vida (1.16-18).

6. A atitude que devemos assumir em vista dos fatos anteriores – o controle da palavra e do temperamento, a pureza da conduta e uma atitude receptiva para com a Palavra de Deus (v.19-21).

 

II. AS OBRAS COMO EVIDÊNCIA DA FÉ VERDADEIRA.

1. A fé verdadeira deve manifestar-se tanto em obedecer como em ouvir a Palavra de Deus (vv.22-25).

2. A fé verdadeira deve manifestar-se na religião prática, cujas características são o domínio da língua, o amor fraternal e a separação do mundo (vv.26,27).

3. A fé verdadeira é demonstrada pela imparcialidade no trato com os pobres e os ricos 92.1-13). Cortesia para com os ricos combinada com descortesia para com os pobres é uma parcialidade que indica fraqueza da fé e que constitui violação da Lei.

4. A fé é provada pelas suas obras (2.14-26). Uma leitura superficial deste trecho poderia dar a impressão de que Tiago estivesse negando a doutrina de Paulo, da justificação pela fé. Martinho Lutero, nos seus primeiros dias, opôs-se fortemente a esta epístola, acreditando que contradizia as doutrinas de Paulo. Mais tarde, no entanto, reconheceu o seu engano. Um estudo mais detalhado de seus escritos convencer-nos-á de que Tiago e Paulo estão perfeitamente de acordo. Paulo crê nas obras da piedade tanto quanto Tiago (2 Coríntios 9.8; Efésios 2.10; 1 timóteo 6.17-19; Tito 3.8). Tiago crê na fé salvadora tanto quanto Paulo (Tiago 1.3,4,6; 2.5). A contradição aparente a que acabamos de nos referir, explica-se pelo fato de ambos os autores usarem as palavras “fé”, “obras”, e “justificação”, mas com diferentes significados para estes termos.

 

III. AS PALAVRAS E SEU PODER.

1. Uma advertência contra o hábito de precipitadamente assumir a posição de mestre, em vista da grande responsabilidade desta vocação e dos perigos de ofender por meio da palavra falada, que é o meio de instrução usado pelo mestre (vv.1,2).

2. O poder da língua (vv.3-5).

3. O mal da língua (vv.6-12).

 

IV. VERDADEIRA E FALSA SABEDORIA.

1. As manifestações da verdadeira sabedoria (3.13,17,18).

2. As manifestações da falsa sabedoria (3.15; 4.1-17).

 

V. Paciência sob opressão: a paciência da fé.

1. Concernente aos opressores e oprimidos (vv.1-6). Tiago fala de uma condição que prevalecerá nos últimos dias, da opressão da classe de trabalhadores pelos ricos, que acabará à vinda do Senhor. O julgamento dos ricos ímpios na destruição de Jerusalém é uma fraca ilustração da sua sorte nos últimos dias.

2. Acerca do Vingador (vv.7-12).

 

VI. Oração

1. na aflição (v.13).

2. pelos enfermos (vv.14-16).

3. A eficácia da oração (vv.17,18).

4. Nosso dever para com o irmão desviado (vv.18-20).

 

Assim, chegamos à conclusão tanto pelo contexto, como  pelo significado da própria palavra, que Tiago e Pedro (1 Pedro 4.8) se referem a um ministério de restauração que faz voltar aos caminhos do Senhor o irmão desviado. Tal ministério causará o arrependimento e a confissão dos pecados e conduzirá ao perdão, mesmo que estes pecados sejam uma ‘multidão’. Está escrito que ‘Se confessarmos os nossos pecados, ele é fiel e justo para nos perdoar os pecados e nos purificar de toda injustiça’ (João 1.9). Assim, por esse ministério, ao qual somos convocados pelo último versículo de Tiago, podemos ser, não somente o meio de salvação de uma alma preciosa que ainda poderá ser útil no mundo, como também poderemos ser instrumentos na remoção de seus pecados, que de outra maneira, como malfeitor, enfrentaria perante o tribunal de Cristo.

 

1ª Epistola de Pedro

A perseguição pode causar tanto crescimento quanto amargura na vida cristã. A resposta a ela determina o resultado. Ao escrever aos crentes judeus que estavam lutando nas perseguições, Pedro os encoraja a se conduzirem corajosamente pela Pessoa e programa de Cristo. Tanto seu caráter quanto sua conduta devem estar acima de reprovação. Tendo nascido novamente para um fé viva, eles devem imitar Aquele que é Santo e que os chamou. O fruto desse caráter será a conduta enraizada na submissão: dos cidadãos aos governantes, dos servos aos senhores, das esposas aos maridos, dos maridos às esposas e de um crente ao outro. Somente quando a submissão é completamente compreendida é que Pedro trata da difícil área do sofrimento. Os cristãos não devem achar estranho “o fogo ardente que surge no meio de vós, destinado a provar-vos, como se alguma cousa extraordinária vos estivesse acontecendo” (4.12), mas devem se regozijar por participarem do sofrimento de Cristo. Essa resposta à vida é verdadeiramente o clímax da nossa submissão à boa mão de Deus.

Esta Epístola começa com a frase Petros apóstolos Iesou Christou, “Pedro, apóstolo de Jesus Cristo”. Esta é a base para o antigo título Ptrou A, a “1 Pedro”.

 

O Autor de 1 Pedro

A Igreja primitiva reconhecia universalmente a autenticidade e a autoria de 1 Pedro. As evidências internas apóiam esse consistente testemunho externo de várias maneiras. O nome do apóstolo Pedro é dado em 1.1. e há semelhanças definitivas entre certas expressões nesta epístola e os sermões de Pedro, conforme registrados no Livro de Atos (cf. 1 Pe.1.20 e At. 2.23; 1 Pe. 4.5 e At. 10.42) Duas vezes em Atos Pedro usou a palavra grega xylon, “madeiro, árvore”, para falar sobre a cruz, e esse uso distinto é encontrado em 1 Pedro ( veja At. 5.30; 10.39; 1 Pe.2.24). A Epístola contém um número de alusões aos acontecimentos da vida de Cristo que tiveram especial importância para Pedro (p. ex. 2.23; 3.18; 4.1; 5.1; cf. 5.5 e Jo. 13.4).

Entretanto, os críticos desde o século dezenove vêm desafiando a autenticidade de 1 Pedro por várias razões. Uns dizem que 1.1-2 e 4.12-5.14 foram acréscimos feitos mais tarde que tornaram um pronunciamento anônimo ou um sermão batismal em uma epístola de Pedro. Outros argumentam que os sofrimentos experimentados pelos leitores desta epístola devem se referir à perseguição dos cristãos que ocorreu depois da época de Pedro, nos reinados dos imperadores Domiciano (81-96 d.C.) e Trajano (98-117 d.C). Não há base para o primeiro argumento e o segundo argumento deduz falsamente que os cristãos não estavam sendo insultados por causa da sua fé durante a vida de Pedro. Um outro desafio afirma que a qualidade do grego desta epístola é muito elevada para um Galileu como Pedro. Mas os galileus eram bilíngües (aramaico e grego), e escritores como Mateus e Tiago eram muito capacitados no uso do grego. É também provável que Pedro tenha usado Silvano como escriba (5.12; Paulo o chama de Silvano em 2 Co1.19; 1 Ts. 1.1; 2 Ts. 1.1; Lucas o chama de Silas em At. 15.40-18.5), e Silvano pode ter atenuado o discurso de Pedro nesse processo.

 

O tempo de 1 Pedro

Esta Epístola é dirigida aos “forasteiros da Dispersão” ou mais literalmente “peregrinos da Dispersão” (1.1). Isso, juntamente com a ordem de manterem seu comportamento “exemplar... no meio dos gentios” (2.12), dá uma idéia inicial de que a maior parte dos leitores é formada por cristãos hebreus. Entretanto, uma análise mais apurada forma uma visão oposta de que a maioria dos leitores é formada por gentios. Eles foram chamados “das trevas” (2.9) e que “antes, não éreis povo, mas, agora, sois povo de Deus” (2.10). O seu “fútil procedimento que vossos pais vos legaram” (1.14,18; cf. Ef. 4.17). Porque eles não mais se envolvem em “borracheiras” e “idolatrias”, são difamados por seus compatriotas (4.3-4). Essas descrições não se encaixam numa liderança predominantemente cristã hebraica. Embora Pedro fosse um apóstolo “da circuncisão” (Gl. 2.8), ele também ministrou aos gentios (At. 10.34-48; Gl 2.12), e uma epístola como esta estaria além do âmbito de seu ministério.

Esta Epístola foi dirigida aos cristãos da Ásia menor, indicando que o evangelho se espalhou por regiões, não evangelizadas quando Atos foi escrito (Ponto, Capadócia, Bitínia; 1.1). É possível que Pedro tenha visitado e ministrado em algumas dessas áreas, mas não há evidência. Ele escreveu esta Epístola em resposta às notícias da crescente oposição aos crentes na Ásia Menor (1.6; 3.13-17; 4.12-19; 5.9-10). A hostilidade e a suspeita aumentavam sendo insultados e maltratados por causa de seu estilo de vida e conversa subversiva sobre outro Reino. O Cristianismo ainda não tinha recebido a interdição oficial romana, mas o palco estava sendo montado para a perseguição e martírio no futuro próximo.

A vida de Pedro foi mudada drasticamente após a ressurreição, e ele ocupava um papel central na Igreja primitiva e no anúncio do evangelho para os samaritanos e gentios (At.2-10). Após o Concílio de Jerusalém, registrado em At. 15, muito pouco é se diz em relação às atividades de Pedro. Ele, evidentemente, viajou extensivamente com sua esposa (1 Co.9.5) e ministrou em várias províncias romanas. Segundo a tradição, Pedro foi crucificado de cabeça para baixo em Roma antes da morte de Nero, em 68 d.C.

Esta Epístola foi escrita em Babilônia (5.13), mas os estudiosos estão divididos a respeito dessa parte se referir literalmente à Babilônia na Mesopotâmia ou simbolicamente a Roma. Não há tradição de que Pedro foi para a Babilônia, e, na sua época, ela possuía poucos habitantes. Por outro lado, a tradição, consistentemente, indica que Pedro passou seus últimos anos de vida em Roma. Como um centro de idolatria, o termo “Babilônia” era uma designação figurada apropriada para Roma (cf. o uso de Babilônia em Ap. 17;18). Pedro usou outras expressões figuradas nesta epístola, e não é de se surpreender que ele fizesse o mesmo com Roma. Sua menção de Marcos (5.13) também se adapta a esse ponto de vista, porque Marcos estava em Roma durante o primeiro cárcere de Paulo (Cl. 4.10). Esta Epístola foi, provavelmente, escrita pouco antes do início da perseguição de Nero, em 64 d.C.       

Esta epístola nos oferece uma ilustração esplêndida de como Pedro cumpriu a missão que lhe foi dada pelo Senhor: “tu, pois, quando te converteres, fortalece os teus irmãos” (Lucas 22.32). Purificado e confirmado por meio do sofrimento e amadurecido pela experiência, Pedro podia pronunciar palavras de encorajamento a grupos de cristãos que estavam passando por duras provas. Muitas das lições que ele aprendeu do Senhor, ele fez saber aos seus leitores (compare 1 Pedro 1.10 com Mateus 13.17; 1 Pedro 5.2 com João 21.15-17; 1 Pedro 5.8 com Lucas 22.31). O versículo 12 do último capítulo sugerirá o tema da epístola – a graça de Deus. Aqueles a quem ela se dirigia estavam passando por tempos de prova. Assim, Pedro os anima demonstrando-lhes que tudo quanto era necessário para ter força, caráter e coragem havia sido provido na graça de Deus. Ele é o “Deus de toda graça” (5.10), cuja mensagem ao seu povo é: “A minha graça é suficiente”. O tema da Primeira a Pedro pode ser resumido da seguinte maneira: a suficiência da graça divina e a sua aplicação prática com relação à vida cristã e para suportar a prova e o sofrimento.

Pedro escreveu esta carta, para animar os fiéis a estarem firmes durante o sofrimento e leva-los à santidade. Seu conteúdo é:

Regozijo no sofrimento por causa da salvação (1.1-12)

Sofrendo por causa da justiça (1.13-3.22).

Sofrendo com Cristo (cap. 4)

Exortações finais (cap. 5)

 

I. REGOZIJO NO SOFRIMENTO POR CAUSA DA SALVAÇÃO:

1. A fonte da nossa salvação (v.2) a) O Pai é quem escolhe; b) O Espírito é quem santifica; c) O Filho com cujo sangue é aspergido.

2. O resultado da salvação: o novo nascimento (v.3)

3. A consumação da salvação: a aquisição da herança celestial que está reservada ao crente, enquanto ele mesmo está guardado pelo poder de Deus (vv.4,5).

4. O gozo da salvação (vv.6-8). Até no meio de provas e tentações que apenas devem testar a fé, os fiéis podem regozijar-se no seu invisível Senhor, com gozo indizível e cheio de glória.

5. O ministério da salvação (vv.9-12) a) os profetas que predisseram os sofrimentos e a glória de Cristo, não compreenderam totalmente as suas próprias profecias. Em resposta às suas perguntas, foi-lhes revelado que a salvação que estavam profetizando não era para eles mas sim para aqueles que viveriam em outra dispensação; b) os anjos que nunca pecaram, desejam perscrutar o gozo inexplicável daqueles que foram redimidos por Cristo.

 

II. SOFRENDO POR CAUSA DA JUSTIÇA:

Nesta seção anotaremos as seguintes exortações:

1. À santidade (1.13-21). Com mente alerta e sóbria, os fiéis devem separar-se de seus antigos hábitos de vida, viver uma vida de santidade à espera da vinda do Senhor.

2. A um amor intenso e sincero para com os irmãos (1.22-25). Este amor seguir-se-á como resultado natural da purificação da alma pelo Espírito Santo e do novo nascimento.

3. A um desenvolvimento espiritual (2.1,2). Como a criança recém-nascida instintivamente deseja alimentar-se com leite, assim os regenerados devem ter um desejo ardente pelo ensino não adulterado da Palavra de Deus, a doçura da qual já experimentamos.

4. A aproximar-se de Cristo, a pedra fundamental do grande templo espiritual, do qual são pedras vivas (2.3-10). Os crentes no seu conjunto formam um grande templo (Ef 2.20-22), do qual eles mesmos são os sacerdócios e onde oferecem sacrifícios espirituais (Hb 13.10, 15). A relação que Israel, como povo terrestre, tinha com Deus, eles – os gentios como povo terrestre, têm com ele, porque é um povo escolhido, uma nação santa, o tesouro peculiar de Deus (v.9; compare com Deuteronômio 7.6).

5. A viver uma vida irrepreensível, para desarmar o preconceito e a inimizade dos pagãos que os cercam (2.11,12).

6. A submissão. A) submissão de todos os cristãos ao governo (2.13-17); b) submissão das mulheres a seus esposos (3.1-7).

7. Ao amor fraternal (vv.8-12)

8. A suportar o mal com paciência (vv.13-16)

 

III. SOFRENDO COM CRISTO:

1. Morte ao pecado (4.1-6). Como Cristo morreu para a vida terrestre e se levantou de novo para uma vida celeste, assim, os cristãos devem considerar-se mortos à vida anterior de pecados, e vivos para uma vida nova de santidade;

2. Importância da conduta em vista da iminente volta do Senhor (vv.7-11)

3. O glorioso privilégio de sofrer com Cristo (vv.12-19). Os cristãos não devem ficar surpresos por Deus prova-los e purificá-los pelo sofrimento, mas devem regozijar-se pelo fato de poderem participar dos sofrimentos de Cristo (vv.12,13). Suportar o opróbrio de Cristo é um sinal da graça espiritual que há neles, mas sofrer como malfeitor é sinal de desonra (v.15). os cristãos devem esperar o sofrimento, porque o juízo deve começar pela casa de Deus – deve haver um tempo de purificação para a Igreja. Assim, todos os que sofrem devem confiar naquele que é fiel (vv.17-19).

 

IV. EXORTAÇÕES FINAIS.

aos pastores (5.1-4);  2. aos moços (vv.5,6);  3. à igreja em geral (vv.6-11);  

4. Saudações (vv12-14).

 

2ª Epístola de Pedro

            A primeira Epístola de Pedro trata de problemas externos; a Segunda Epístola de Pedro trata de problemas internos. Pedro alerta os crentes sobre os falsos mestres que estão causando danos à doutrina. Ele começa pedindo-lhes que cuidem bem de sua vida pessoal. A vida cristã requer diligência na busca da excelência moral, conhecimento, autocontrole, perseverança, santidade, bondade fraternal e amor abnegado. Por outro lado, os falsos mestres são sensuais, arrogantes, gananciosos e avarentos. Eles ridicularizam o pensamento do julgamento futuro e vivem sua vida como se o presente fosse o padrão para o futuro. Pedro lhes lembra que, embora Deus possa ser longânimo em enviar seu julgamento, ele certamente virá. À vista deste fato, os crentes devem viver vidas santas, irrepreensíveis e perseverantes.

            A afirmação de autoria em 1.1 é muito clara: “Simão Pedro, servo e apóstolo de Jesus Cristo.” Para distinguir esta Epístola da primeira de Pedro, ela levou o título grego de Petrou B, “2 Pedro”.

            A primeira epístola de Pedro trata do perigo fora da Igreja: perseguições. A segunda de Pedro, do perigo dentro dela: a falsa doutrina. A primeira foi escrita para animar, a segunda, para advertir. Na primeira, vê-se Pedro cumprindo a sua missão de fortalecer os irmãos (Lucas 22.32); na segunda, cumprindo a sua missão de pastorear as ovelhas, protegendo-as dos perigos ocultos e insidiosos, para que andem nos caminhos da justiça (João 21.15-17). Na segunda epístola, o autor dá uma viva descrição dos falsos mestres que ameaçam a fé da Igreja, e como um antídoto à vida pecaminosa deles, exorta os cristãos a servirem-se de todos os meios para crescer na graça e no conhecimento experimental de Jesus Cristo. O tema pode-se resumir da seguinte maneira: um conhecimento completo de Cristo é uma fortaleza contra a falsa doutrina e uma vida impura.

 

O autor de 2 Pedro

            Nenhum outro livro no Novo Testamento cria mais problemas de autenticidade do que 2 Pedro. Diferentemente de 1 Pedro, essa epístola possui um testemunho externo muito fraco, e a genuinidade é maculada por dificuldades internas também. Por causa desses obstáculos, muitos estudiosos rejeitam a autoria de Pedro para essa Epístola, mas isso não significa que não haja evidência para a posição oposta.

            Evidência externa: O testemunho externo para a autoria de Pedro de 2 Pedro é mais fraco do que qualquer outro livro do Novo Testamento, mas até o quarto século ela se tornou reconhecida como uma obra autêntica do apóstolo Pedro. Não há qualquer citação do segundo século de 2 Pedro que seja incontestável, mas no terceiro século ela é citada em escritos de vários pais da Igreja, principalmente Orígenes e Clemente de Alexandria. Os escritores do terceiro século estavam freqüentemente conscientes a respeito de 2 Pedro e respeitavam seu conteúdo, mas ainda era catalogada como um livro contestável. O quarto século via o reconhecimento oficial da autoridade de 2 Pedro apesar de algumas dúvidas. Por várias razões, 2 Pedro não foi rapidamente aceita como um livro canônico.

            Evidência interna: Por outro lado, 2 Pedro traz testemunho abundante de sua origem apostólica. Ela reivindica ser “Simão Pedro” (1.1) e 3.1 diz: “Amados, esta é, agora, a segunda epístola que vos escrevo”. O autor refere à profecia do Senhor sobre a morte do apóstolo em 1.14 (cf. Jo. 21.18-19) e diz que ele foi uma testemunha ocular da Transfiguração (1.16-18). Como um apóstolo (1.1), ele se coloca num nível de igualdade com Paulo (3.15). Há também palavras distintas que são encontradas em 2 Pedro e nos sermões de Pedro em Atos, assim como palavras  incomuns, e expressões compartilhadas entre 1 e 2 Pedro.

 

O tempo de 2 Pedro

            A maioria dos estudiosos considera 3.1 (“Amados, esta é, agora, a segunda epístola”) como uma referência a 1 Pedro. Nesse caso, Pedro tinha os mesmos leitores da Ásia Menor em mente, embora a saudação mais geral em 1.1 também permitisse uma audiência mais abrangente. Pedro escreveu essa epístola em resposta a ensinamentos heréticos que se espalhavam, que eram mais traiçoeiros porque surgiam de dentro da Igreja. Os falsos mestres pervertiam a doutrina da justificação e promoviam um modo de vida rebelde e imoral.

            Essa epístola foi escrita pouco antes da morte do apóstolo (1.14), provavelmente em Roma. Seu martírio aconteceu entre 64 e 66 d.C., (se Pedro estava vivo em 67 quando Paulo escreveu a Segunda Timóteo durante seu segundo cárcere romano é improvável que Paulo o tivesse mencionado).

Foi escrita esta epístola para dar uma ilustração profética da apostasia dos últimos dias, e para exortar os cristãos à preparação do coração e da vida que unicamente pode habilita-los a enfrentar os seus perigos., seu conteúdo é formado:

Exortação a crescer na graça e no conhecimento divino (cap. 1)

Advertência contra os falsos mestres (cap.2)

Promessa da vinda do Senhor (cap.3).

 

I. Exortação a crescer na graça e no conhecimento divino.

1. Saudação (vv.1,2);

2. A base da sabedoria salvadora – as promessas de Deus (vv.3,4). 

3. O crescimento no conhecimento experimental (vv.5-11). Não há uma parada na experiência cristã; haverá progresso ou retrocesso. O fiel tem um fundamento, a fé, mas sempre deve estar edificando sobre este fundamento uma “super-estrutura” de caráter e virtude cristãos. Note:

a) O resultado deste ‘acréscimo’ espiritual (v.5): frutificação no conhecimento experimental das coisas divinas e aquisição da entrada no reino do Senhor Jesus, amplamente suprida (vv.8,10,11); b) O resultado da negligência do crescimento espiritual – cegueira espiritual e apostasia (v.8).

4. As fontes do conhecimento salvador; a) O testemunho dos apóstolos que foram testemunhas oculares da glória de Cristo (vv.12-18); b) O testemunho dos profetas (vv.19-31).

 

II. Advertência contra os Falsos Mestres.

1. A conduta dos falsos mestres (vv.1-3). Eles introduzem, furtiva e artificialmente, heresias fatais, negando até o próprio Senhor. Cobrindo os seus verdadeiros motivos com argumentos plausíveis desviarão muitos do caminho.

2. A condenação certa destes falsos mestres mostra-se nos exemplos antigos de retribuição (vv.4-9).

3. O caráter destes falsos mestres (vv.10-22). O apóstolo provavelmente tem em vista o surgimento futuro das seitas gnósticas, que combinavam uma moral corrompida a uma vida contaminada. As seguintes seitas surgiram no segundo século: os ofiólatras, que adoravam a serpente do jardim do Éden como o seu benfeitor; os cainitas, que exaltavam como heróis alguns dos personagens mais vis do Antigo Testamento; os carpócratas que ensinavam a imoralidade; os antítactos que consideravam a violação dos  Dez Mandamentos como um dever para com o Deus supremo, pela razão de terem sido eles promulgados por um ímpio anjo mediador.

 

III. Promessa da vinda do Senhor.

1. Os zombadores e a promessa da segunda vinda (vv.1-4)

2. Respostas às suas objeções (vv.5-9)

3. A certeza, a presteza e os efeitos da vinda do Senhor (vv.10-13)

4. Exortações finais: a) a viver sem culpa à luz da sua grande esperança (v.14); b) a lembrar que o motivo da demora do Senhor é dar aos homens uma oportunidade de se arrependerem (vv.15,16); c) a guardar-se de se desviar do caminho pela falsa doutrina (v.17); d) a crescer na graça (v.18).

 

1A Epístola de João

            Deus é luz; Deus é amor, e Deus é vida. João compartilha de uma deliciosa comunhão com o Deus da luz, amor e vida, e ele deseja desesperadamente que seus filhos espirituais compartilhem da mesma comunhão.

            Deus é luz. Dessa forma, para termos comunhão com ele, devemos andar na luz e não nas trevas. Conforme andamos na luz, confessaremos regularmente nossos pecados, permitindo que o sangue de Cristo nos purifique continuamente. Cristo agirá como nosso advogado perante o Pai. A prova de nosso “andar na luz” será o cumprimento dos mandamentos de Deus e substituir qualquer ira que tenhamos por nosso irmão pelo amor. Os dois principais impedimentos desse caminhar são a paixão pelo mundo e a confiança nas sedutoras mentiras dos falsos mestres.

            Deus é amor. Já que somos seus filhos, devemos andar em amor. Na realidade, João diz que, se não amamos, não conhecemos a Deus. Além disso, nosso amor precisa ser prático. O amor é mais do que simples palavras; é ação. O amor é dar e não receber. O amor bíblico é incondicional em sua natureza. É um amor “apesar de”. O amor de Cristo preenche essas qualidades,e, quando esse tipo de amor nos caracteriza, estamos livres da auto-condenação e experimentamos confiança perante Deus.

            Deus é vida. Aqueles que têm  comunhão com ele devem possuir suas qualidades de vida. A vida espiritual começa com o nascimento espiritual. O nascimento espiritual ocorre através da fé em Jesus Cristo. Aem Jesus Cristo inspira em nós a vida de Deus – vida eterna. Assim, aquele que anda em comunhão com Deus andará na luz, amor e vida.

            Embora o nome do apóstolo João não seja encontrado nesse livro, ele levou o título Ioanonou A, “1 João”.

 

O autor de 1 João

A evidência externa da autoria de 1 João demonstra que, desde o início, ela foi universalmente recebida sem contestação como autoridade. Ela foi usada por Policarpo (que conheceu João em sua juventude) e Papias no início do segundo século; e, mais tarde, naquele século, Irineu (que conheceu Policarpo na juventude) atribuiu esse livro especificamente ao apóstolo João. Todos os pais da Igreja grega e latina aceitaram essa epístola como de João.

A evidência interna apóia essa tradição universal, porque a fraseologia do “nós” (apóstolos), “vós” (leitores) e “eles” (falsos mestres) coloca o escritor na esfera das testemunhas apostólicas (cf. 1.1-3;4.14). O nome de João era bem conhecido dos leitores, e era desnecessário mencioná-lo. O estilo e vocabulário de 1 João são tão semelhantes àqueles do quarto Evangelho que a maioria dos estudiosos reconhece esses livros como escritos pelas mesmas mãos. Ambos compartilham muitas expressões específicas de João e as características do vocabulário limitado e o freqüente contraste de opostos são também comuns a ele. Mesmo  assim, alguns críticos atacaram essa conclusão baseados em vários fatores, mas as diferenças teológicas e de estilos não são substanciais o suficiente para suplantar as abundantes semelhanças.

A visão tradicional é também rejeitada por aqueles que sustentam que o quarto Evangelho e essas três epístolas foram escritas por João, o “presbítero”, que deve ser distinguido de João, o apóstolo. Mas a única base para essa diferença é a interpretação de Eusébio em sua História Eclesiástica (323 d.C.) de uma afirmação de Papias. Eusébio compreendia que essa passagem se referia a dois diferentes Joãos, mas as palavras não expressam isso; o presbítero João e o apóstolo João não podem ser a mesma pessoa. Mesmo que fossem diferentes, não há evidências que contradigam o reconhecimento consistente da Igreja primitiva de que esse livro foi escrito pelo apóstolo João.

 

O Tempo de 1 João

            Em At. 8.14, João é associado com “os apóstolos, que estavam em Jerusalém”, e Paulo o chama de “coluna” da Igreja de Jerusalém em Gl.2.9. Com exceção de Ap. 1, o Novo Testamento silencia a respeito desses últimos anos, mas a tradição cristã primitiva, uniformemente, nos diz que ele saiu de Jerusalém (provavelmente não muito antes de sua destruição, em 70 d.C.) e que ministrou em Éfeso e nas suas vizinhanças. As sete igrejas da província romana da Ásia, mencionadas em Ap. 2-3, eram evidentemente uma parte desse ministério. Embora não haja um destinatário em 1 João, é provável que o apóstolo tenha dirigido sua epístola às igrejas asiáticas que estavam no âmbito de sua supervisão.

Os crentes dessas congregações estavam bem fundamentados na verdade cristã, e João lhes escreveu não como a principiantes, mas como a irmãos enraizados na doutrina apostólica (2.7,18-27;3.11). O apóstolo não menciona seus negócios, mas o uso dos termos “amados” e “filhinhos” confere a essa epístola um toque pessoal, que revela seu relacionamento íntimo com os destinatários originais. 1 João foi, provavelmente, escrita em Éfeso após o Evangelho de João, mas a data não pode ser definida com certeza. Nenhuma perseguição é mencionada, o que sugere uma data anterior a 95 d.C., quando a perseguição começou durante o final do reinado de Domiciano (81-96 d.C.).

Já bem velho, João escreveu sua epístola por causa da preocupação amorosa com seus “filhos”, cuja longanimidade,  na verdade, estava sendo ameaçada pela sedução mundana e astúcia dos falsos mestres. A heresia gnóstica ensinava que a matéria é má por herança, e um ser divino não poderia se encarnar. Isso resultou na distinção entre o Jesus homem e o Cristo espiritual que veio sobre Jesus no seu batismo, mas o deixou antes da crucificação. Outra variação era o docetismo ( de dokeo, “parecer”), a doutrina de que Cristo somente parecia ter um corpo humano. O resultado em ambos os casos era o mesmo – a negação total da encarnação.

Os gnósticos também criam que sua compreensão do conhecimento escondido (gnoses) os fazia um tipo de elite espiritual que estava acima das diferenças normais de certo e errado. Isso levou, na maioria dos casos, a uma conduta deplorável e uma completa desconsideração da ética cristã.

O Evangelho de João expõe os atos e palavras que provam que Jesus é o Cristo, o Filho de Deus; a primeira epístola de João expõe os atos e palavras obrigatórios àqueles que crêem nesta verdade. O Evangelho trata dos fundamentos da fé cristã, a Epístola, dos fundamentos da vida cristã. O Evangelho foi escrito para dar um fundamento de fé; a Epístola para dar um fundamento de segurança. O Evangelho nos conduz ao limiar do Pai; a Epístola, familiariza-nos com a sua casa. A Epístola é uma carta afetuosa de um pai espiritual a seus filhos na fé, na qual ele os exorta a cultivar a piedade prática que produz a união perfeita com Deus, e a evitar a forma de religião em que a vida não corresponde à profissão. Para alcançar o seu propósito, o apóstolo estabelece certas regras, pelas quais pode ser provada a verdadeira espiritualidade – regras que formam a linha rígida de demarcação entre aqueles que apenas professam andar em amor e santidade, e aqueles que verdadeiramente o fazem. Embora João fale de uma maneira clara e severa, ao tratar da doutrina errônea e da vida incompatível, o seu tom, contudo, em geral é afetuoso e mostra que ele merece o título de “apóstolo do amor”. A freqüente repetição da palavra ‘amor’ e a expressão ‘filhinhos’, faz com que a sua epístola tenha uma atmosfera de ternura. Aqui cabe bem a seguinte história concernente a João: quando o apóstolo chegou a uma idade muito avançada e somente com dificuldade podia ser transportado à igreja, nos braços dos seus discípulos, e estava fraco demais para poder proferir exortações extensas, nas reuniões dizia apenas: “Filhinhos, amai-vos uns aos outros!”. Os discípulos e pais, cansados da constante repetição das mesmas palavras, disseram: “Mestre, por que estás sempre repetindo isto?” Ele respondeu: “É o mandamento do Senhor e se for feito apenas isto, será o suficiente.”

Resumiremos o tema da seguinte maneira: os fundamentos da segurança cristã e da comunhão com o Pai, ela foi escrita provavelmente cerca de 90 A.D. em Éfeso, onde João vivia e ministrava depois de sair de Jerusalém, com os seguintes propósitos, delcarados na própria epístola:

1. Para que os filhos de Deus tenham comunhão com o Pai e o Filho, e uns com os outros (1.3);

2. Para que os filhos de Deus possam ter plenitude de gozo (1.4);

3. Para que não pequem (2.1);

4. Para que reconheçam o fundamento da vida eterna (5.13).

 

Enfoque

Base para a Comunhão

Comportamento da Comunhão

Referência

1.1--------------2.15---------------2.28--------------5.4---------------5.21

Divisão

Condições para

A Comunhão

Cuidados com

A Comunhão

Características

Da Comunhão

Conseqüências

Da Comunhão

Tópico

Significado da Comunhão

Manifestações da Comunhão

Permanecendo na luz de Deus

Permanecendo no amor de Deus

Cenário

Escrita em Éfeso

Data

Cerca de 90 d.C.

 

Conteúdo:

Introdução (1.1-4)

Comunhão com Deus (1.5-2.28)

Filiação divina (2.29-3.24)

O espírito da verdade e o espírito do erro (4.1-6)

Deus é amor (4.7-21)

A fé (5.1-12)

Conclusão: a confiança cristã (5.13-21).

Nota: as citações deste estudo de João são do comentário de Pakenham-Walsh sobre a primeira epístola de João.

 

I. Introdução.

1. A substância do evangelho: a divindade, a encarnação de Cristo (v.1)

2. A garantia do evangelho;  a) a experiência de Paulo; b) o testemunho apostólico

3. O propósito da pregação do evangelho; a) para que os crentes possam ter comunhão com os apóstolos e com todos os cristãos; b) para que os crentes possam participar de todas as bênçãos e privilégios que os apóstolos obtiveram da sua comunhão com o Pai; c) O resultado do evangelho: a plenitude de gozo que vem da comunhão perfeita com Deus. (vv.2-4)

 

II. Comunhão com Deus.

O apóstolo dá as seguintes provas de comunhão com Deus:

1. Andar na luz (1.5-7);

2. Conhecimento e confissão de pecado (1.8-2.1);

3. Obediência aos mandamentos de Deus em imitação de Cristo (2.2-6);

4. Amor para com os irmãos (2.7-11)

5. Afastamento do mundanismo (vv. 12-17)

6. Doutrina pura (2.18-28)

 

III. Filiação Divina.

João deu as seguintes provas da filiação divina:

1. Andar retamente (2.29-3.10);

2. Amor para com os irmãos (3.11-18)

3. A segurança (3.19-24)

 

IV. O Espírito da Verdade e o Espírito do Erro.

O pensamento da habitação do Espírito em nós (3.24), leva João a tratar – em parêntese – de outros espíritos: os espíritos falsos e maus, e de como os cristãos podem distingui-los.

  1. O apelo (v.1);  2. A prova (.2);  3. O conflito (v.4);  4. O contraste (vv. 5,6).
  2.  

V. Deus é amor (4.7-21)

1. A vitória da fé (5.4,5);  

2. O tríplice testemunho terrestre da fé (vv.6-8);

3. O testemunho celestial (vv.9-12).

 

VII. Conclusão: A confiança Cristã.

1. A substância da confiança cristã – a segurança ou certeza da vida eterna (v.13);

2. A manifestação da confiança cristã.

3. Exortação final (v.21).

 

2A e 3A Epístolas de João

 

I. Segunda Epístola de João.

O Livro de 2 João

            “Aquele, pois, que pensa estar em pé veja que não caia” (1 Co.10.12). Estas palavras do apóstolo Paulo poderiam muito bem figurar como um subtítulo para a pequena epístola de João. Os destinatários uma senhora eleita e seus filhos, estavam obviamente em pé. Eles estavam andando na verdade, permanecendo fiéis aos mandamentos que receberam do Pai. João está profundamente satisfeito em saudá-los. Mas, para ele, nada está garantido. Percebendo que permanecer em pé está a apenas um passo da queda, ele não hesita em lembrá-los: amar uns aos outros. O apóstolo admite que isso não é uma nova revelação, mas vê necessariamente importante repeti-lo. Amar uns aos outros, diz ele, é a mesma coisa que andar de acordo com os mandamentos de Deus.

            João indica, entretanto, que esse amor precisa ser discernido. Não é um amor do tipo ingênuo, impensado, aberto a qualquer um ou a qualquer coisa. O amor bíblico é uma questão de escolha; é perigoso e tolo passar pela vida com um amor sem discernimento. Falsos mestres estão pelo mundo e eles não reconhecem que Cristo veio em carne. É um falso amor abrir a porta para ensino falso. Precisamos ter comunhão com Deus. Precisamos ter comunhão com os cristãos. Mas não devemos ter comunhão com falsos mestres.

O “presbítero” do v.1 tem sido tradicionalmente identificado com o apóstolo João, resultando no título grego Ioannou B, “2 João”.

            Por causa da semelhança dos conteúdos e circunstâncias de 2 e 3 João, a autoria de ambas será considerada aqui. Essas epístolas não circularam largamente no começo, tendo em vista sua brevidade e endereçamento específico a um pequeno número de pessoas. Esse circulação limitada, combinada com o fato de que elas tinham poucas idéias distintas a acrescentar em 1 João, resultou no fato de serem raramente citadas nos escritos patriarcais da Igreja Primitiva. Seu lugar no Cânon dos livros do Novo Testamento foi desafiado por um certo tempo, mas é significativo notar que não havia questionamento na mente daqueles pais da Igreja que viveram perto da época de João de que essas duas epístolas foram escritas por João. Os escritores do segundo século Irineu e Clemente de Alexandria também não tinham outra opinião. Apenas quando os detalhes de sua origem foram esquecidos é que as dúvidas surgiram, mas as evidências positivas em seu favor acabaram conquistando para elas o reconhecimento oficial de toda a Igreja.

É óbvio que os destinatários de 2 e 3 João conheciam bem a identidade do autor, embora ele não use seu nome. Ao contrário, ele se auto-designa no primeiro versículo de ambas as epístolas como “o presbítero”. Isso não é um argumento contra a autoria joanina de 2 e 3 João, uma vez que o contexto dessas epístolas revela que sua autoridade era bem maior do que a de um presbítero de uma igreja local. O apóstolo Pedro, também refere a si mesmo com um presbítero (1 Pe. 5.1), e João usa de maneira distinta o termo “o presbítero”.

A semelhança no estilo, vocabulário, estrutura e modo verbal entre 2 e 3 João deixa claro que essas epístolas foram escritas pelo mesmo autor. Além disso, ambas (especialmente 2 João) têm forte semelhança com 1 João e com o quarto Evangelho. Assim, as evidências externas e internas dão claro apoio ao ponto de vista tradicional, segundo o qual essas epístolas foram escritas pelo apóstolo João.

 

O Tempo de 2 João

            A identificação dos leitores originais desta epístola é difícil por causa dos desacordos no que diz respeito à interpretação da “senhora eleita e seus filhos” (v.1). Alguns estudiosos acreditam que o endereçamento deveria ser tomado literalmente para se referir a uma mulher específica e seus filhos, enquanto que outros preferem tornar isso como uma descrição figurada de uma igreja local.

            A evidência é insuficiente para uma conclusão decisiva, mas, em ambos os casos, os leitores eram bem conhecidos de João e, provavelmente estavam vivendo na província da Ásia, perto de Éfeso. Se o ponto de vista figurado for levado em conta, a expressão “os filhos da tua irmã eleita” (v.13) se refere aos membros de uma igreja irmã.

            Em sua primeira epístola, João escreveu que numerosos falsos mestres foram embora da igreja (“eles saíram de nosso meio; entretanto, não eram dos nossos”, 1 Jo.2.19). Alguns destes se tornaram mestres viajantes que dependiam da hospitalidade de indivíduos enquanto buscavam infiltrar nas igrejas com seus ensinos.

            Julgando pelo conteúdo e circunstâncias de 2 João, ela era evidentemente contemporânea de 1 João ou foi escrita não muito tempo depois. Foi, provavelmente, escrita por volta do ano 90 d.C. todas as três epístolas de João podem ter sido escritas em Éfeso.

A primeira Epístola de João é uma carta à família cristã em geral, prevenindo-a contra a falsa doutrina e exortando-a à piedade prática. A segunda Epístola é uma carta a um membro particular dessa família, escrita com o propósito de instruí-lo quanto à atitude correta para com os falsos mestres. Não devia dar-lhes hospitalidade. Tal mandamento pode parecer duro; mas é justificado pelo fato de estas doutrinas atacarem os próprios fundamentos do Cristianismo, e em muitos casos, ameaçarem a pureza da conduta. Ao receber tais mestres em sua casa, a crente, a quem João escrevia, identificar-se-ia com os seus erros. João não ensinava o mau tratamento aos cristãos que doutrinariamente diferem de nós ou que se encontram nos laços do erro.

João escrevia em época em que os antinômios e gnósticos, errados, procuravam minar a fé e a pureza. Sob tais condições era imperativo que os cristãos denunciassem as suas doutrinas erradas, tanto por palavras como pela atitude. O tema pode resumir-se da seguinte maneira: é dever obedecer à verdade e evitar comunhão com os seus inimigos. Esta Epístola foi escrita para advertir uma senhora cristã e hospitaleira a não hospedar falsos mestres.

 

II. Terceira Epístola de João

 

O Livro de 3 João

            Na Primeira Epístola de João, o apóstolo discute a comunhão com Deus; na Segunda Epístola de João, proíbe a comunhão com falsos mestres; e, na Terceira Epístola de João, encoraja a comunhão com os irmãos cristãos. Seguindo sua expressão de amor por Gaio, João lhe assegura suas orações por sua saúde e expressa sua alegria pela persistência de Gaio em andar na verdade e pela maneira como ele mostra hospitalidade e apoio aos missionários que foram à sua igreja. A frase “encaminhando-os em sua jornada” significa providenciar ajuda para a jornada dos missionários. Incluídos nessa ajuda podem estar comida, dinheiro, acomodação para os companheiros e meios para a viagem. Ao sustentar estes homens que estavam ministrando por Cristo, Gaio se tornou um companheiro da verdade.

            Mas nem todos na igreja fizeram da mesma maneira. O coração de Diótrefes está a cento e oitenta graus distante do coração de Gaio. Ele já não está mais vivendo em amor. O orgulho tomou a dianteira em sua vida. Ele recusou uma epístola que João tinha escrito para a igreja, temendo que sua autoridade fosse suplantada pela do apóstolo. Ele também acusou a João com palavra maliciosas e se recusou a aceitar missionários. Ele proíbe outros de aceitarem os missionários e até mesmo os expulsa da igreja, caso lhe desobedeçam. João usa esse exemplo negativo como uma oportunidade para encorajar Gaio a continuar com sua hospitalidade. Demétrio tem um bom testemunho e pode até mesmo ser um daqueles que foram expulsos por Diótrefes. Ele é amplamente conhecido por seu caráter e sua lealdade à verdade. Aqui, ele é bem recomendado por João e é colocado com um exemplo positivo para Gaio.

            Os títulos no grego da Primeira, Segunda e Terceira Epístola de João são Ioannou A, B, e G. O G é gama, a terceira letra do alfabeto grego; Ioannou G significa “3 João”.

 

O Autor de 3 João

            A autoria de 2 e 3 João foi considerada junta por causa dos conteúdos e circunstâncias dos dois livros serem semelhantes. Embora a evidência externa para 2 e 3 João seja limitada (existe ainda menos para 3 João do que para 2 João), o pouco que há aponta, consistentemente, para o apóstolo João como sendo o autor. A evidência interna é mais forte e ela, também, apóia a origem apostólica de ambas as epístolas.

 

O tempo de 3 João

            Os paralelos entre 2 e 3 João sugerem que essas epístolas foram escritas na mesma época (90 d.C.). Escritores cristãos primitivos são unânimes em seu testemunho de que o quartel general de João ao fim de seu ministério era em Éfeso, a principal cidade da província romana da Ásia. Evidentemente, João enviava um número de mestres viajantes para espalharem o evangelho e para solidificarem as igrejas asiáticas, e esses mestres eram apoiados por cristãos que os recebiam em seus lares.

            A Terceira Epístola de João, provavelmente entregue por Demétrio, foi ocasionada pelo relatório de alguns desses emissários (chamados “irmãos” nesta carta), que retornaram ao apóstolo e o informaram sobre a hospitalidade de Gaio e sobre a hostilidade de Diótrefes. O arrogante Diótrefes tomou as rédeas de uma igreja asiática e se declarou sua autoridade proeminente. Ele perverteu a autoridade de João e rejeitou os mestres enviados por João, expulsando aqueles da sua igreja que desejassem recebê-los.

            Gaio era um nome comum no Império Romano, e outros três homens com o mesmo nome são mencionados no Novo Testamento: 1) Gaio, da Macedônia, que era um dos companheiros de Paulo (At.19.29); 2) Gaio, de Derbe (At.20.4); e 3) Gaio, hospedeiro de Paulo em Corinto, um dos poucos corintios batizados por Paulo (Rm.16.23; 1 Co.1.14). O Gaio de 3 João evidentemente vivia na Ásia, e é melhor distingui-lo desses outros homens.

            No v.9, João faz uma alusão a outra epístola que Diótrefes rejeitou. Esta pode ser 1 ou 2 João, mas o que mais parece é uma epístola que se perdeu ou talvez tenha sido destruída por Diótrefes.

Esta curta Epístola dá uma idéia de certas condições que existiam numa igreja local no tempo de João. A história que pode ser colhida da Epístola, parece ser a seguinte: João tinha enviado um grupo de mestres itinerantes, com cartas de recomendação, a diferentes igrejas, uma das quais, era a assembléia a que pertenciam Gaio e Diótrefes.

Diótrefes, dominado pelo ciúme dos direitos da igreja local, ou por alguma razão pessoal, recusou-se a dar hospitalidade a estes mestres e expulsou os membros da igreja que os recebiam. Gaio, um dos membros da igreja, não se deixou intimidar pelo ditador espiritual e hospedava os missionários e obreiros, os quais mais tarde, contaram a sua bondade ao apóstolo. Parece que João estava para enviar estes mestres pela segunda vez (v.6) e exortou a Gaio a continuar no ministério de amor para com eles. João mesmo escreveu uma carta de advertência a Diótrefes, que foi desprezada. Por isso o apóstolo expressou a sua intenção de fazer uma visita pessoal à igreja e a destituir esse tirano eclesiástico. Resumiremos o tema da seguinte maneira: o dever da hospitalidade para com o ministério e o perigo de uma direção ditatorial. Esta Epístola foi escrita para elogiar Gaio por ter recebido os obreiros cristãos que dependiam inteiramente da hospitalidade dos crentes e para denunciar a falta de hospitalidade e a tirania de Diótrefes.

 

Epístola de Judas

O Livro de Judas

Lute! Batalhe! Quando a apostasia se levantar, quando os falsos mestres surgirem, quando a verdade de Deus foi atacada, é hora de lutar pela fé. Somente os crentes que estão espiritualmente “em forma” podem responder a essas ordens. No início de sua epístola, Judas enfatiza a salvação dos crentes, mas depois se sente compelido a desfiá-los a lutar pela fé. O perigo é real. Os falsos mestres se infiltram na Igreja, transformando a graça de Deus em licenciosidade ilimitada para fazerem o que desejam. Judas lembra a tais homens como Deus tratou no passado o Israel descrente, anjos desobedientes e as impiedosas Sodoma e Gomorra. Em face de tal perigo, os cristãos não podem ser pegos desprevenidos. O desafio é grande, mas assim é o Deus que nos guarda de tropeçar.

O título grego Iouda, “de Judas”, vem da palavra Ioudas, que aparece no v.1. Essa palavra que pode ser traduzida por Judas era popular no primeiro século por causa de Judas Macabeus (morto em 160 a.C.), um líder da resistência judaica contra a Síria durante a revolta dos macabeus.

 

O autor de Judas

Apesar do assunto e tamanho limitados, Judas foi aceita como autêntica e citada pelos pais da Igreja primitiva. Pode haver alusões mais antigas, mas referências irrefutáveis a essa Epístola aparecem no final do segundo século. Ela foi incluída no Cânon Muratoriano (cerca de 170 d.C.) e aceita como parte das Escrituras pelos antigos líderes, tais como Tertuliano e Orígenes. Entretanto, dúvidas surgiram em relação ao lugar de Judas no Cânon, por causa de seu uso dos Apócrifos. Ela foi um livro contestado em algumas partes da Igreja, mas, finalmente, ganhou o reconhecimento universal.

O autor se identifica como “servo de Jesus Cristo e irmão de Tiago” (v.1). Essa designação, combinada com a referência feita no v.17 aos apóstolos, torna improvável que este seja o apóstolo Judas, chamado de “Judas, o filho de Tiago” em Lc. 6.16 e At. 1.13. Isso abandona o ponto de vista tradicional de que Judas era um dos irmãos do Senhor, chamado de Judas em Mt. 13.44 e Mc. 6.3. Seu irmão mais velho, Tiago era um líder famoso da igreja de Jerusalém (At.15.13-21) e autor da Epístola que tem o seu nome. Assim como seus irmãos, Judas não cria em Jesus antes da Ressurreição (Jo.7.1-9; At. 1.14). A outra alusão bíblica a ele está em 1 Co.9.5 onde é registrado que “os irmãos do Senhor” levavam suas respectivas esposas em suas viagens missionárias (o Judas de At.15.22,32 pode se outra referência a ele). A tradição extra-bíblica não acrescenta nada ao nosso limitado conhecimento de Judas.

 

O Tempo de Judas.

A alocução geral de Judas não menciona nenhum círculo de leitores em particular, e não há restrições geográficas. Entretanto, ele, provavelmente, tenha tido em mente uma região específica que começava a ter problemas com falsos mestres. Não há informação suficiente na epístola para solucionar a questão de que os leitores eram predominantemente judeus ou gentios cristãos (há provavelmente, uma mistura de ambos). De qualquer modo, o progresso da fé nesta região estava sendo ameaçado por um número de apóstatas que rejeitavam a Cristo em prática e em princípio. Esses libertinos orgulhosos eram especialmente perigosos por causa de suas adulações enganosas (v.16) e infiltração nas reuniões cristãs (v.12). eles pervertiam a graça de Deus (v.4) e causavam divisões na igreja (v.16).

A descrição de Judas desses hereges pode também ser encontrada em 2 Pedro, o que nos leva à questão do relacionamento entre essas duas epístolas. A forte semelhança entre 2 Pe. 2.1 – 3.4 e Jd. 4-18 dificilmente é coincidência, mas as igualmente diferenças óbvias descartam a possibilidade de ser uma simples cópia da outra. Duvida-se também que ambos os autores tenham usado uma terceira fonte desconhecida; desta forma, as duas opções restantes são que Pedro usou Judas ou Judas usou Pedro. Ambos os pontos de vista têm seus defensores, e um grande numero de argumentos tem sido levantado para apoiar os dois lados. Mas dois argumentos que afirmam que 2 Pedro foi escrita primeiro são tão fortes que favorecem esta posição: 1) Uma comparação dos dois livros mostra que 2 Pedro antecipa o aparecimento de mestres apóstatas (2 Pe.2.1-2;3.3) enquanto Judas registra o cumprimento histórico das palavras de Pedro (Jd. 4,11-12,17-18); 2) Judas cita diretamente 2 Pe. 3.3 e a reconhece como uma citação dos apóstolos (cf. 1 Tim. 4.1; 2 Tim. 3.1).

Por causa do silêncio do Novo Testamento e da tradição a respeito dos últimos dias de Judas, não podemos saber onde a epístola foi escrita. Nem há qualquer forma de saber a data exata. Partindo do princípio de que 2 Pedro veio primeiro (64-66 d.C.),  a época provável é 66-80 d.C. (O silêncio de Judas em relação a Jerusalém não prova que ele escreveu essa epístola antes de 70 d.C.).

Há certa semelhança entre a segunda Epístola de Pedro e a de Judas; ambas tratam da apostasia na Igreja e descrevem os líderes dessa apostasia. Parece que Judas, a respeito deste tema, cita Pedro (compare 2 Pedro 3.3 com Judas 18). Ambos têm em mente a mesma classe de desviados – homens de moral relaxada e de excessos vergonhosos. Pedro descreve a apostasia como futura; Judas, como presente. Pedro expõe os falsos mestres como ímpios e extremamente perigosos, mas não no seu estado pior; Judas descreve-os em extrema depravação e na maior desordem. Foi a presença destes homens na Igreja, e a sua atividade em propagar as suas doutrinas, o que fez Judas escrever esta Epístola cujo tema é o dever que têm os cristãos de guardarem-se sem mancha, e de lutarem sinceramente pela fé, no meio da apostasia.

Acredita-se que o autor foi Judas, irmão de Tiago, e de nosso Senhor (Marcos 6.3).

Esta Epístola foi escrita provavelmente entre 70 e 80 a. D.,  para adverti-los contra os apóstatas dentro da Igreja, aqueles que, embora tendo negado a fé, ficaram ainda como membros da igreja.

Judas a princípio tinha a intenção de escrever a respeito da doutrina, mas a presença dos falsos mestres fez com que os advertisse para lutar pelas verdades do evangelho (vv.3,4). Para ilustrar a condenação destes mestres, ele menciona três exemplos da antiga apostasia (vv.5-7). Estes apóstatas, sempre cedendo às suas próprias imaginações, são culpados tanto de pecado carnal como de rebelião contra a autoridade (.8), e falam da autoridade em termos que nem Miguel, o arcanjo, se atreveu a usar ao falar a Satanás (v.9). atrevem-se a falar mal das coisas espirituais, que não compreendem. Mas nas coisas que compreendem, eles se corrompem (v.10). Seu pecado e condenação estão prefigurados pela Escritura (v.11) e pela natureza (vv.12,13). São os temas verdadeiros da profecia de Enoque (v.14). Quanto ao caráter, são murmuradores, queixosos, aduladores astutos, zombadores das coisas espirituais, homens que causam divisões, inteiramente carnais, não tendo o Espírito de Cristo (vv.16-19). Os crentes, porém, em contraste com estes, devem edificar-se na fé, orar no Espírito Santo, permanecer no amor de Deus, sempre olhando para Jesus (vv.20,21). Quanto àqueles que erraram por fraqueza e estavam vacilando, devia-se ter compaixão; quanto aos outros, devia-se empregar um esforço supremo para salvá-los, mas ao mesmo tempo sempre vigilantes para não se contaminarem com a roupa manchada da doutrina corrompida e da vida sensual (vv. 22,23). Judas conclui com uma doxologia que louva àquele que pode guardar o crente de cair na apostasia e no pecado e que é capaz de conservá-lo irrepreensível até ao grande dia (vv.24,25).

 


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