3 de fev. de 2021
PONTOS E INTERESSES EM UMA NEGOCIAÇÃO
Já passou por uma situação em que um colega de trabalho tentou lhe puxar o tapete? Por que será que as pessoas estão sempre disputando nosso espaço, muitas vezes de maneira agressiva?
Durante muito tempo, negociar significava vencer a qualquer preço, levar vantagem em tudo. No contexto contemporâneo, entretanto, negociadores devem buscar, além do alcance dos resultados, a manutenção dos relacionamentos. Mas é razoável admitir que não é tarefa fácil conseguir sempre ganhos mútuos em uma negociação. E por que a tendência natural do homem diante de um impasse parece ser a de adotar uma postura agressivo-competitiva?
Na verdade, o mapa mental construído na infância, através de jogos e brincadeiras, favorece o desenvolvimento de um instinto competitivo (CRUZ, 2010). Assim, não é de se estranhar que, para a maioria, negociação soe como sinônimo de competição.
No entanto, ressaltamos a importância de priorizar um bom relacionamento e a busca por ganhos mútuos. Para isso, é importante que o negociador supere o instinto competitivo trazido da infância para a vida adulta. É vital reconhecer as diferenças e desenvolver uma atitude de observação constante.
Além disso, deve-se fazer o mapeamento das motivações e interesses das partes envolvidas e procurar soluções criativas que contemplem os interesses de todos.
Para entendermos melhor, é preciso saber a diferença entre posições e interesses. As posições são aquelas manifestadas abertamente, enquanto os interesses representam os desejos ocultos, ou seja, aquilo que as partes realmente anseiam em relação ao objeto alvo da negociação.
Podemos recorrer à imagem de um iceberg para ilustrar essa questão. É sabido que a característica principal de um iceberg é que a maior parte do seu bloco está submersa. No caso de uma negociação, a parte oculta representa os interesses, que têm peso maior na negociação, mas são mais difíceis de visualizar.
Sendo assim, “o assunto velado é o real valor do produto a ser negociado” (CRUZ, 2010, p. 15). Quando o vendedor da loja de roupas elogia demais o quanto a peça que você experimentou ficou no seu corpo, você começa a se perguntar se ele está sendo sincero, ou se está pensando apenas na comissão dele. Logo, é papel do negociador de talento levantar os reais interesses das partes envolvidas e traçar estratégias para lidar com eles. É a partir desse conhecimento que o profissional poderá definir sua linha de atuação, bem como as alternativas e possíveis.
Outro ponto fundamental são os aspectos comunicativos. Uma negociação é, antes de tudo, um processo de comunicação entre pessoas que tentam chegar a bom termo em um acordo. Nesse contexto, é razoável deduzir a complexidade dessa tarefa, afinal, o mal-entendido é uma característica natural da comunicação humana (CRUZ, 2010).
Para prevenir problemas e desentendimentos, precisamos saber ouvir e proporcionar um feedback constante ao outro. Devemos levar em conta quais aspectos verbais e visuais serão utilizados. Sem falar do fator cultural das partes, bem como dos fatores afetivos e emocionais. É crucial evitar a redundância, ou repetição desnecessária de informações, e a distração.
O uso de meios indiretos de comunicação, como correio eletrônico e mensagens via telefonia móvel, podem ser grandes geradores de ruído. Nesse caso, o feedback cresce em importância, a fim de assegurar o entendimento e a correta interpretação das informações transmitidas. No caso de reuniões, o uso de elementos visuais práticos como planilhas, gráficos e apresentações eletrônicas facilitam a compreensão dos aspectos objetivos da negociação.
Diante dos desafios da comunicação, apresentamos algumas técnicas práticas de negociação, que podem auxiliar no entendimento e na manutenção do relacionamento (PINHEIRO, 2012; CRUZ, 2010):
- Quebra-gelo;
- Loop feedback;
- Feedback sanduíche;
- What if.
A começar pelo quebra-gelo, que funciona muito bem para abrir uma rodada de negociações e encontros com tom menos formal como almoços e eventos. O negociador recorre a assuntos de interesse comum, como esporte, família e viagens. Isso ajuda a criar um clima mais leve e facilita a empatia. Mas tome cuidado com temas polêmicos, como futebol ou religião.
Para auxiliar na compreensão da informação recebida, há o loop feedback. Como funciona? Logo após receber uma informação, o negociador repete o que ouviu e acrescenta uma explicação com a sua interpretação. Em seguida pergunta ao outro se era isso mesmo que ele quis dizer. Com isso, se obtém de maneira dinâmica uma confirmação se a mensagem foi devidamente compreendida.
O loop feedback é conhecido como a “técnica do garçom”. Esse procedimento é muito útil para comunicações via e-mail.
Quando se precisa dirigir uma crítica a alguém durante a negociação é preciso ter tato, pois as pessoas não lidam bem com críticas. Uma reação emocional negativa pode transformar a mesa de negociação num ringue de luta. Para evitar isso, existe a técnica do feedback sanduíche. Nesse caso, a crítica é literalmente um recheio, que se deve envolver em duas fatias de elogio. Iniciamos nossa fala com um elogio em relação ao outro, em seguida, fazemos a crítica de forma elegante e objetiva, finalizando com outro reforço positivo. Entretanto, essa técnica não pode ser usada com muita frequência, pois fica rapidamente desgastada (CRUZ, 2010).
Para o momento da finalização do negócio, a técnica do what if (e se...) ajuda na apresentação de alternativas e no fechamento de compromissos. Quando se está concluindo os trabalhos, mas ainda não se tem um acordo porque a outra parte reclamou de algum item, pode-se dizer: “mas e se fecharmos esse item conforme você solicitou, temos um acordo?”. É uma maneira interessante de conseguir uma resposta do outro lado, sem colocá-lo contra a parede.
Diante de tudo que foi dito, como podemos nos preparar para uma negociação? Como é possível estar aparelhado para negociar com eficácia, angariar resultados e relacionamento, além de aplicar as técnicas adequadas para cada situação?
Um processo indispensável para qualquer negociação é o planejamento. Planejar é antecipar, coletar informações, construir cenários possíveis, definir bem os objetivos, analisar as alternativas e traçar estratégias. A munição do negociador são dados sólidos e atualizados. Quem leu “A Arte da Guerra” sabe que o mestre Sun Tzu diz: “conhece teu inimigo e conhece-te a ti mesmo; se tiveres cem combates a travar, cem vezes será vitorioso” (SUN TZU, 2012, p. 42).
Em suma, planejar uma negociação é se preparar, listando as posições e os reais interesses envolvidos em torno do objeto. É conhecer a fundo o perfil do seu “oponente” (aqui colocado entres aspas, para que não seja interpretado como um inimigo, mas apenas como alguém que representa a outra parte e cujos interesses quase sempre são tão legítimos quanto os seus).
O negociador deve então antecipar o máximo possível de cenários, sem, no entanto, perder de vista a importância da flexibilidade. Afinal, na qualidade de brainworker, deve ser um provedor de soluções, apto a se adaptar às reviravoltas que surgem no percurso negocial.
No contexto do planejamento, torna-se vital para o negociador o delineamento da ZOPA, ou Zona de Possíveis Acordos. Este conceito está relacionado a “ter previamente claro o posicionamento de ambas as partes, isto é, identificar que variáveis estão em jogo, oportuniza a criação de um espaço de negociação, bem como o estabelecimento de limites: até onde é possível flexibilizar as condições postas à mesa por ambos os lados? Da mesma forma, no que e como é possível ceder? E, se existentes, quais os termos do que é inegociável?” (PINHEIRO, 2012, p. 35).
Dessa forma, a ZOPA se constitui no espaço onde é possível negociar. A Figura 7 representa graficamente esta área, que é delimitada pelos limites pré-estabelecidos por cada parte da negociação.
Ao conhecermos a zona de interesses da outra parte, é possível encontrar a interseção onde os desejos de todos convergem. É nessa região que o acordo será fechado e a missão do negociador é encontrar dentro dela o ponto de equilíbrio que deixará satisfeitos os envolvidos. Fora dessa área não existe possibilidade de acordo, pois extrapolaria os investimentos e/ou concessões que
se pode ou que se está disposto a fazer.
Diante disso, é importante discutirmos quais são as estratégias que o negociador pode adotar. Tais estratégias irão nortear a postura do profissional durante a negociação, auxiliando na tomada de decisões acerca dos resultados e do relacionamento que se espera obter ao final dos trâmites.
A Matriz Lewiki, Hiam, Olander (Figura 8) fornece um leque de opções quanto às ações que o negociador pode tomar. As linhas de atuação variam de acordo com o foco maior ou menor dado seja aos resultados, seja ao relacionamento:
- Competitiva;
- Evitar;
- Acomodação;
- Colaborativa.
Quando o negociador dá mais ênfase aos resultados, preterindo a manutenção do relacionamento, ele adota uma estratégia competitiva, conhecida como ganha-perde, porque obtém ganhos em resultados, mas perde no relacionamento. Nesse caso, se por um lado, obtemos bons resultados no presente, negociações futuras podem ser prejudicadas pelos ressentimentos deixados pela postura agressiva do negociador.
Quando há grandes possibilidades de perda tanto nos resultados, como no relacionamento para ambos os lados, a melhor estratégia talvez seja evitar, também conhecida como fuga.
Quando se prioriza o relacionamento, abrindo mão parcialmente dos ganhos, essa é a estratégia conhecida como acomodação. É o perde-ganha, pois há uma perda em resultados, mas ganha-se no relacionamento. É aplicável quando a obtenção de favores no futuro é mais vantajosa do que ganhos momentâneos.
Por fim, quando o negociador consegue equilibrar o foco na manutenção do relacionamento com a possibilidade de ganhos mútuos, ela alcança o ganha-ganha, que é a estratégia da colaboração. É claro que o objetivo de todo negociador de talento deve ser a colaboração, mas a arte da negociação é contingencial. Cada situação exige posturas diferentes e muitas vezes uma linha de atuação mais competitiva pode ser necessária. Pelo exposto, deduzimos que o negociador deve ser um profissional dotado de uma tomada de decisões flexível, nunca perdendo o equilíbrio emocional. Aliás, é no controle das emoções que se encontra o ponto definidor da busca por um estágio racional de resolução de conflitos, que se constitui no que chamamos de negociação cognitiva.
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